sábado, 7 de dezembro de 2024

 CASA DOS AVÓS, SEGREDOS E JERONIMO, O HERÓI DO SERTÃO!

Merece um estudo, provavelmente uma tese de doutorado, o fascínio dos netos pela casa dos avós. Penso, que o assunto, e a casa dos avós, devam ser dissecados como um anatomista faz em um corpo sem vida, com certeza existem particularidades em cada corpo dissecado e em cada casa de avó, porém a semelhança entre as casas dos avós seja mais comuns.
O que então fascina o neto? Geralmente as casas dos avós não tem nenhum atrativo arquitetônico. São casas simples, com móveis antigos e o espaço vazio deixados pelos filhos e que geralmente são preenchidos por um gato ou um cão de estimação, mais nada disso fascina um neto, mas o acúmulo de história e de quinquilharia que faz da casa dos avós um parque de diversão o atrativo para os netos. Não existe nenhuma casa de avô ou de avó que não tenha um quarto empoeirado ou um armário a ser descoberto. São revistas e jornais amarelados pelo tempo, que guardam alguma lembrança da juventude, coleções de selos intermináveis, cartas de amor dos avós, bijuterias que sobrevivem ao tempo, livros, fitas cassetes, LPs e tudo que a história de vida representou ou que lembre a juventude que se foi.
A casa dos meus avós maternos, Flora Camões da Costa e Hegezzippo Franklin da Costa, a segunda casa em que moraram, ficava na Rua de Santana, em frente da Igreja de Santana. Era uma casa comum, tipo meia morada e sem nenhuma característica externa que chamasse a atenção. Na parte da frente da casa ficava o consultório odontológico do meu tio Franklin. O corredor alcançava todos os cômodos da casa, e o segundo cômodo, ficava o quarto da minha avó Flora e de sua irmã Maria Camões, a Cotinha ou Dindinha como eu a chamava. Neste quarto existia um grande guarda-roupa de madeira preta, com um espelho na porta e trancado com chave impossibilitando o acesso dos netos. Ali ficava guardado um precioso tesouro do meu tio Franklin: a coleção de Revistas dos Esportes, Tico-Tico, Cruzeiro com a escolha de todas as misses, Fatos e Fotos e jornais, tinha de tudo naquele guarda-roupa para um neto descobrir.
Na sala, bem ao lado da cadeira em que minha avó costumava sentar, existia um rádio, provavelmente um Transglobo de válvula, sintonizado pontualmente todos os dias, às 18 horas na Rádio Nacional, onde todos da casa e os que passavam pela casa, ouviam e viviam as emoções da radionovela “Jeronimo, o Herói do Sertão”. O silêncio era uma situação extremamente necessária para a perfeita audição das falas dos atores, que competiam com os chiados do Transglobo de válvulas.
No quintal havia um galinheiro com algumas galinhas e galos anciãos. Nenhuma galinha foi para a panela na casa da minha avó, todas foram criadas pelo meu tio como “filhas”, até o galo de Franklinho, ruidoso e valente sobreviveu ao apetite de Zé Carlos, Nereide e Regina.
Guardo cartas, selos, projetos, pequenas histórias, revistas, jornais, livros e sonhos dentro de um guarda-roupa, um dia as minhas netas vão descobrir, ou quem sabe, ache tudo desnecessário e joguem fora ou se perca em alguma mudança.
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sexta-feira, 15 de novembro de 2024

 COINCIDÊNCIAS E SIMILIARIDADES – PARTE INTODUTÓRIA

HISTÓRIAS DE SÃO LUIS – A INTERVENTORIA DE PAULO RAMOS

AUTOR: HAMILTON RAPOSO DE MIRANDA 


Paulo Martins Ramos era maranhense da cidade de Caxias, filho de Raimundo Martins de Sousa Ramos e de dona Maria Porcina dos Santos Ramos. Paulo Ramos iniciou seus estudos em São Luís e adolescente mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro, onde ficou sob os cuidados do seu irmão, José Martins de Sousa Ramos, um jurista conceituado naquela cidade.


 Paulo Ramos retornou para São Luís e concluiu o curso secundário no Liceu Maranhense. Paulo Ramos, anos depois, formou-se em Direito em Belém do Pará e ingressou no serviço público federal através de concurso. Era funcionário do Ministério da Fazenda. 


Paulo Ramos foi casado com a senhora Maria Nazaré Pires Chaves com quem teve 06 (seis) filhos.


No dia 15 de agosto de 1936, após o processo de impeachment que culminou com a cassação do então governador do estado do Maranhão, Prof. Dr.  Aquiles Lisboa, Paulo Ramos, por indicação do Presidente Getúlio Vargas e por influência política do embaixador Osvaldo Aranha de quem era amigo particular, Paulo Ramos é eleito de forma indireta pela Assembleia Legislativa do Estado para o cargo de governador do estado do Maranhão. 


Em 1937, Getúlio Vargas através de um golpe de estado, instalou no Brasil uma ditadura, que ele autodenominou de estado novo, quando outorgou uma Nova Constituição e decretou o fechamento do Congresso Nacional, com a desculpa de um perigo comunista no Brasil, devido a fracassada “intentona comunista” de 1935. Nesta época Getúlio Vargas e a elite brasileira flertavam com o nazifascismo alemão e deflagrou grande perseguição ao Partido Comunista Brasileiro, em particular a sua principal liderança, Luís Carlos Prestes, que teve sua companheira, Olga Benário Prestes, presa pela polícia política de Getúlio Vargas e entregue aos nazistas alemães, devido sua condição de judia, onde foi torturada e assassinada pelos nazistas em campo de concentração.


Nesta época, Getúlio Vargas fecha as Assembleias Legislativas, atitude esta chamada de missão Negrão de Lima, e destitui todos os governadores estaduais, nomeando para estes cargos, interventores federais, e assim, Paulo Martins Ramos, em 1937 foi nomeado interventor do Maranhão, onde desenvolveu um profícuo trabalho no estado, destacando-se a criação do Banco do Estado, o Departamento de Estrada de Rodagens (DER), construção dos hospitais Nina Rodrigues, Colônia do Bonfim, depois chamado de Hospital Aquiles Lisboa, Hospital Getúlio Vargas, restauração do Hospital Geral e a criação do Centro de Saúde Paulo Ramos.

Paulo Ramos serviu o Maranhão como interventor até 1945 e com o enfraquecimento do estado novo, retorna ao serviço público federal. 


Em 1950 Paulo Ramos é convidado por Getúlio Vargas para organizar o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) no Maranhão e se elegeu deputado federal em 1951. No fim do seu mandato, Paulo Ramos se afastou da vida política e retornou para o serviço público federal, onde se aposentou em 1968. No dia 16 de fevereiro de 1969, Paulo de Sousa Ramos faleceu na cidade do Rio de Janeiro.

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

 

A HISTÓRIA PSICOPATOLÓGICA DE VICENT VON GOGH

 

IDENTIFICAÇÃO: Vicente Von Gogh nasceu em 30 de março de 1853 em Zundert - Holanda, era filho de Theodoro Von Gogh e de Ana Cornélia Carbenti, artista plástico falecido em 23 de julho de 1890.

 

PERSONALIDADE PRÉ-MÓRBIDA:  Irritável, briguento e por pequenas divergências de opinião se transformava em brigas violentas.

 

HISTÓRIA CLÍNICA: Aos 21 anos (1874) apresentou descuido com a aparência e das atividades profissionais, isolamento social e redução do apetite.

Aos 24 anos apresenta um outro episódio, tem sentimento de culpa e se submete a diversas autopunições, bate em si próprio com um bastão, alimenta-se apenas de pão e se priva do sono. O discurso torna-se incoerente e cheio de ideias absurdas.

Aos 26 anos se envolve com a religião e passa atuar como evangelista na cidade de Borinage na Bélgica, e tem uma atuação com fervor fora do normal, faz trabalhos domésticos no mosteiro, reza na cabeceira de acidentados, trabalha dia e noite, doa todos os seus pertences aos pobres, inclusive as suas economias, recusa-se a comer e anda descalços e com roupas feitas de saco. É expulso da ordem religiosa devido seu comportamento ser considerado inadequado.

Volta para a casa dos pais na Holanda e seu pai decide interna-lo em uma instituição para doentes mentais. É a sua primeira internação.

Aos 31 anos Vicente Von Gogh tem insônia, diminuição do apetite, perda de peso e é descrito por familiares como irritadiço, triste e infeliz.

Aos 35 anos escreve uma carta para o seu irmão Theo, grande amigo e confidente, e diz “sentir-se muitíssimo bem, carregado de eletricidade, uma locomotiva para pintar, as ideias para o trabalho me vem em abundância”. Von Gogh trabalha com o pintor Paul Gauguin com quem se desentende e em um acesso de fúria, em uma noite de Natal, corta o lóbulo da sua orelha esquerda e tenta entregar para uma prostituta, que denuncia o caso para a polícia.

Von Gogh novamente é internado e devido gravidade do seu estado mental, é levado para uma solitária onde fica por vários dias amarrado. É internado no Hospital de Arles e assistido pelo Dr. Félix Rey, não alienista, que fez o seguinte diagnóstico: “Vicente Von Gogh é portador de uma espécie de epilepsia caracterizada por alucinações e por episódios de agitação confusa, cujas crises eram favorecidas pelo excesso de álcool.”

Outro não alienista, o diretor do Hospital de Arles, fez o seguinte diagnóstico: “uma espécie de mania aguda com dellirium generalizado.”

Aos 36 anos (1889/02) o quadro clínico de Von Gogh se deteriora e é internado novamente no Hospital de Arles, devido apresentar “delírios persecutórios, alucinações auditivas, tristeza, sentimento de vazio, incapacidade para o trabalho, autoestima muito baixa, episódios de agressividade, persegue e agride vizinhos, invade suas casas e faz ameaça de suicídio.” É internado novamente através da força policial atendendo petição assinada pelos vizinhos que não suportavam mais a sua convivência.

Entre abril e maio de 1889, Von Gogh é internado no Asilo de Saint-Paul – de – Maurale, devido apresentar “sentimento de vazio na cabeça, cansaço, melancolia, remorsos atrozes e incapacidade para o trabalho.” É assistido pelo médico não alienista, Dr. Peyron, que formula o diagnóstico” de mania e epilepsia.”

Em julho de 1889 recebe alta hospitalar e logo após a alta, de regresso para Arles, sofre uma nova crise, tem “alucinações auditivas, delírios de perseguição (acredita que autoridades católicas querem lhe envenenar e lhe aprisionar), quase não fala, não se alimenta e tenta suicídio ingerindo tinta.”

No dia 27/07/1890, Von Gogh sai para o campo para pintar uma das suas mais bela obra, mas só retorna à noite e estava sangrando na altura do abdome. Ele havia disparado um tiro em seu abdome. Von Gogh veio a óbito 30 horas depois do atentado, na madrugada do dia 29/07/1890, aos 37 anos, ao lado do seu irmão Theo e é este quem ouve as suas últimas palavras: “Falhei mais uma vez...não chora, fiz isso para o bem de todos... a tristeza duraria para sempre.”

 

sábado, 2 de novembro de 2024

 

PSIQUIATRIA FORENSE: O CASO DE THEODORE BUNDY O MONSTRO DE VERMONT.

ESTUDO CLÍNICO PESQUISADO POR HAMILTON RAPOSO (MÉDICO PSIQUIATRA)

 

Theodore Robert Bundy era de uma família de classe média, nasceu em 24/11/1946 em Vermont – EUA, era casado e tinha 01 filho.

Ted Bundy como era conhecido, estudou na Universidade de Stanford e formou-se com honra em Psicologia e logo após a sua formatura trabalhou como assistente de Psicologia na Comissão de repressão ao crime em Seattle.

Ted Bundy tinha como característica a beleza física e uma personalidade carismática, atraente e gentil. Era um sedutor.

O período de atuação criminal de Ted Bundy foi de 1974 a 1978.

Nos primeiros 08 meses de 1974 cerca de uma universitária desaparecia por mês na área de Seattle e os desaparecimentos, coincidentemente, pararam quando Ted se mudou para Salt Lake City, onde entrou para a Universidade de Utah para estudar Direito.

As vítimas de Seattle eram atacadas por Ted, que se fingia ser uma autoridade pública, deixava-as inconscientes para estuprá-las e depois matá-las.  Era comum ele voltar ao local do crime e manter relações sexuais com os cadáveres das vítimas, algumas em estado de putrefação.

Em Utah, onde estudava Direito, começaram a desaparecer universitárias. Em agosto de 1975 ele foi preso por dirigir de forma perigosa e enquanto estava preso, foi encontrado em seu carro um fio de cabelo que era idêntico ao de uma menina estuprada e cujo corpo tinha sido despedaçado e encontrado no estado do Colorado.

Ted Bundy foi levado para Aspen e aguardava julgamento por homicídio. Na prisão conquistou a confiança dos guardas prisionais e de procuradores, conseguindo fugir pulando de uma altura de 12 metros. Uma semana depois foi preso, escondido em uma casa abandonada, em uma montanha de Aspen.

Em dezembro de 1977 conseguiu fugir novamente e desta vez fingiu ser aluno da Universidade da Flórida. No dia 15/01/1978 invadiu o alojamento feminino, estuprou e matou com golpes de taco de basebol duas estudantes e quando retornava para o alojamento masculino, estuprou e matou mais uma estudante que se encontrava dormindo.

No dia 09/02/1978, Ted Bundy raptou uma menina de 12 anos, a quem estuprou e matou, escondendo o seu corpo em um galpão vazio.

No dia 14/02/1978, Bundy foi preso e identificado criminalmente, alguns dias depois.

A evidência criminal de Ted Bundy ou a sua marca criminal era a marca de uma mordida na nádega das vítimas.

Ted foi avaliado por uma junta pericial forense que o considerou como um psicopata sádico e responsável por todos os seus atos. Ted foi a júri popular em 1981 e condenado a morte. No júri confessou o assassinato de 30 mulheres.

No dia 24/01/1989 Theodore Robert Bundy foi executado na cadeira elétrica.

 

BREVE HISTÓRICO SOBRE “O MONSTRO DO COHATRAC”.

No final da década de 1980, a cidade de São Luís foi tomada por uma onda de desaparecimento de mulheres. Estes desaparecimentos aconteceram entre os anos de 1987 a 1989 todos na área do bairro Cohatrac e para a surpresa de todos, um pacato e excelente capoteiro e estofador, com as iniciais de L.M.F.S era o principal suspeito.

Extremamente simpático, bem apresentado fisicamente, L.M.F.S teria sido namorado de uma das vítimas, melhor, de uma das desaparecidas. Investigado neste caso, o “falante” e sempre disposto a conversar sobre as suas conquistas amorosas, não demorou muito para assumir como o autor do desaparecimento e assassinato desta vítima, como de outras 04 (quatro) vítimas, no total. L.M.F.S havia assassinado 05 (mulheres), todas suas ex-namoradas e enterradas no interior de sua residência, que servia de oficina para o seu ofício e para a surpresa da comunidade do bairro do Cohatrac, que jamais suspeitaria que aquele homem, simpático, educado e sempre chegado a uma boa conversar seria capaz de cometer tantos e tenebrosos crimes, ficando de imediato conhecido através da imprensa maranhense, como o “monstro do Cohatrac.”

Conheci L.M.F.S na Penitenciária de Pedrinhas, hoje conhecido como Complexo Penitenciário de Pedrinhas, quando este já havia sido condenado e pude conviver e conversar com ele quase que diariamente, durante 09 (nove) anos, a quem nunca chamei por apelido ou alcunha, como sempre fiz com todos os internos e internas, chamava-o pelo nome e acrescentava sempre antes do nome o pronome senhor ou senhora e nunca, em nenhum momento, fui ameaçado ou discutir com qualquer detento. No meu ponto de vista todos eram seres humanos e que estavam naquele local por infligir a lei brasileira.

Quem era L.M.F.S?

L.M.F.S, conhecido como o monstro do Cohatrac, era mineiro de Governador Valadares, solteiro, tinha uma profissão definida de capoteiro e de estofador, profissão que exercia no ambiente prisional reformando moveis e estufados para diversos órgãos públicos do estado. Elegante e sempre pronto para uma conversa, pude ao longo de 09 anos conhece-lo um pouco.

Quais os crimes que L.M.F.S cometeu e de que forma havia cometido?

L.M.F.S era muito simpático e um conquistador nato, e não era fácil conquistar as suas vítimas, que depois de um certo período de namoro, começavam a frequentar a sua residência e geralmente durante um ato sexual, estrangulava as suas vítimas, que depois de mortas, enterrava-as dentro de sua própria residência. Certa vez, conversando comigo sobre o prazer de cometer estes crimes, L.M.F.S me revelou que o maior prazer sexual que sentia era quando escutava o som de um pescoço quebrando. Outra vez, durante a minha investigação psiquiátrica forense, o encaminhei para realização de exame tomográfico do crânio e de eletroencefalograma em uma clínica da cidade, e durante o preenchimento da ficha pela atendente, ele teria respondido à jovem que sua profissão era de matador de mulheres.

Quem eram as suas vítimas?

Todas as suas vítimas eram mulheres brancas, com nível de instrução médio ou superior incompleto, de classe social média e na faixa etária de 20 a 30 anos. Todas muito jovens.

Qual o perfil psicopatológico de L.M.F.S?

Em todas as inúmeras conversas que tive com o sentenciado, ele sempre se apresentava em boas condições de higiene, estava sempre desacompanhado de qualquer agente prisional, demonstrava confiar em mim e necessidade de conversar e de contar suas inúmeras aventuras amorosas e profissionais, principalmente o produto final do seu trabalho como estofador ou artesão. Demonstrava-se conversador, cooperativo, nunca deixou um questionamento sem resposta e era extremamente envolvente em suas colocações, procurando sempre responder ou emitir opiniões dentro de uma lógica muito pessoal.

Era autossuficiente e incapaz de reconhecer qualquer desvantagem, sempre tinha uma resposta para impor ou contestar alguma opinião que não fosse do seu agrado, entretanto, nunca demonstrou qualquer atitude agressiva com o entrevistador. Às vezes, verborrágico, mostrava suas razões para o cometimento dos delitos e propósitos futuros, quando saísse do sistema prisional. 

Apresentava grande disposição para o trabalho, ofício que realizava com extrema dedicação, tanto as funções estofador, como a de artesão. Passava grande parte do dia na oficina de carpintaria da penitenciária e por este fato, seu comportamento era considerado como excelente.

Desfrutava de grande confiança por diretores e agentes de segurança, porém não era um líder entre os presos, gostava mais da convivência com funcionários do que com os outros internos.

Não caracterizamos nenhum sintomas de natureza psicótica ou de prejuízo intelectual ou cognitivo.

Conclusões finais:

O sentenciado L.M.F.S era portador de grave defeito na formação de sua personalidade (transtorno de personalidade antissocial – tipo psicopático), sendo considerado assassino em série, definido pela prática de 02 (dois) ou mais crimes cometidos pela mesma pessoa, durante determinado tempo. Um outro fator determinante para o diagnóstico do nosso personagem, foi o perfil das vítimas e o modo de atuação delituosa do sentenciado. L.M.F.S demonstrava um comportamento exibicionista, sem sentimento de culpa, egocêntrico e com um limite muito tênue entre controle da sua vontade e a liberação de impulsos mórbidos.

Vida prisional:

Entretanto, mesmo sendo considerado um assassino em série, deve-se frisar, que durante o exercício das suas funções profissionais no ambiente prisional, foi observado uma melhora acentuada nos seus relacionamentos interpessoais, ficando inclusive mais receptivo, calmo e cumpridor das suas obrigações no presídio. Comprova-se desta forma, a influência do trabalho, principalmente quando remunerado, no controle de distúrbios de comportamento em ambiente fechado.

O final de L.M.F.S, o monstro do Cohatrac:

L.M.F.S foi assassinado em 2003 durante uma rebelião na Penitenciária de Pedrinhas

Obs: Todas estas observações estão contidas no prontuário do detento

HAMILTON RAPOSO DE MIRANDA FILHO

 

 

KATÁ, O TERROR DE SÃO LUÍS NO INÍCIO DA DÉCADA DA 1970.

 

 No final da década de 1960 a pacata São Luís foi surpreendida por um brutal crime de homicídio. Um homem, morador nas imediações da Rua do Norte, chegando à Praça da Saudade, havia assassinado com vários golpes de faca a sua própria esposa, que segundo informações da época, estaria grávida e após o transloucado ato, o homem teria atentado contra a sua própria vida, sendo levado ao Hospital do Pronto Socorro e sobrevivido. Desde esta época havia dúvida sobre a sanidade mental deste homem.

E quem era este homem, que com tamanha crueldade, foi capaz de assassinar a sua esposa, que estava grávida de seu próprio filho, sem nenhum motivo que justificasse este ato de tamanha violência?

Esta pessoa tinha as iniciais de O.N.G.F, conhecido nos bairros de São Pantaleão, Madre-Deus e adjacências pela alcunha de Katá. Ele morava na Rua do Norte, em frente à Praça da Saudade, afirmava ter a profissão de marceneiro e havia servido o Exército Brasileiro, nº 912 e vivia perambulando pela Rua do Norte, Praça da Saudade e Rua de São Pantaleão. Tinha um porte físico tipo atlético e era um contumaz usuário de maconha e constantemente envolvia-se em confusões, tinha um comportamento agressivo e desafiador.

Katá costumava-se vestir-se com roupas femininas e assim caminhava pelas ruas da cidade geralmente armado com uma faca tipo “peixeira” escondida por baixo da roupa e quando provocado, por estar usando roupas femininas, reagia sempre de forma ameaçadora.

Foi preso por diversas vezes e desde a época do brutal assassinato, o advogado contratado pela família para a sua defesa, Dr. José de Jesus Jansen Pereira, alegava que o seu constituinte era inimputável e deveria ser transferido para o Hospital Nina Rodrigues.

Conheci Katá na década de 1970 quando estudava no Liceu Maranhense e confesso que morria de medo ao vê-lo falando sozinho, com trajes inadequados ou insultando as pessoas. Posteriormente, o conheci pessoalmente, e conversei com ele por diversas vezes quando estagiava no Hospital Nina Rodrigues sob a supervisão da extraordinária professora e psiquiatra, Dra. Maria Olímpia Carneiro Mochel.

O.N.G.F, o Katá, possuía diversas internações no Hospital Nina Rodrigues. A primeira internação aconteceu no período de 06/08/1965 a 31/09/1965 e a última internação em 14/02/1982, quando foi preso no bairro do Desterro portando diversos cartuchos de maconha. Em todas as internações de Katá, todas em caráter compulsória, ele se evadia, pouquíssimas vezes recebeu alta melhorada. Uma dado me chamou atenção, era que Katá mesmo submetido a todas as terapias existentes na época, aí se inclui o eletrochoque, Katá não apresentava melhora do ponto de vista de conviver em sociedade, talvez o consumo exagerado de maconha tenha agravado o seu espado psicopatológico.

Na análise da documentação que tenho em posse, Katá tinha no prontuário o diagnóstico de “Personalidade Psicopática”, sendo assim, juridicamente semi-imputável.

No dia 03/05/1971 O.N.G.F, o Katá, foi submetido a uma nova perícia a pedido do seu advogado e realizado pelo médico psiquiatra e professor, Dr. Beethovem Matos Chagas, que o diagnosticou como portador de “Esquizofrenia Paranoide”, sendo assim, inimputável, livre de qualquer tipo de condenação.

Após a perícia e já de alta médica e com recomendação de manter o tratamento no ambulatório do Hospital Nina Rodrigues, Katá permaneceu agressivo, resistente ao tratamento e extremamente ameaçador, embora não tivesse mais cometido nenhum crime de homicídio, permaneceu consumindo maconha e foi preso diversas vezes.

A sua última internação aconteceu no dia 14/2/1982, sempre de forma compulsória e nesta época, Katá não tinha mais os pais e nenhum parente que pudesse ou tivesse coragem em acolhe-lo, vivia pelas ruas e assentava-se no bairro do Desterro, conhecido pelas inúmeras “boca de fumo”.

No dia 25/05/1982, eu, médico recém-formado e ainda na especialização em Psiquiatria, com interesse na Psiquiatria Forense, por influência do estimado professor e o mais renovado psiquiatra forense do Brasil, Prof. Dr. Talvane Marins Moraes, recebi no estado do Rio de Janeiro, uma intimação assinada pelo MM Juiz de Direito, Dr. Sebastião Leopoldo M. de Campos, Titular da 6ª Vara Criminal da Capital, convocando-me para ser perito oficial no exame de sanidade mental em O.N.G.F, o Katá.

Em julho, durante meu período de férias do curso de especialização, iniciei o exame mental em Katá, que já estava bastante alquebrado e com sinais de sintomas psicóticos. Katá não esperou a conclusão do exame e evadiu-se do Hospital Nina Rodrigues, algum tempo depois, doente e com sequelas de um AVC, Katá veio a óbito em sua residência.

Assim foi a história de Katá, mais um personagem da cidade de São Luís. Uma triste história!

HAMILTON RAPOSO DE MIRANDA FILHO

 

FAÍSCA, O HERÓI MARGINAL DA DÉCADA DE 1960.

 

 

Conheci Faísca nos arredores da Praça da Alegria. Faísca morava na casa do seu avô, o seu Joaquim, um ourives respeitado que tinha a sua oficina de consertos de relógios, cordões e pulseiras de ouro, na sua própria residência, na Rua de Santa Rita, era vizinho dos meus pais.

Faísca era um jovem neuro-atípico, um prejudicado intelectualmente e que, por conta das suas limitações, principalmente do juízo crítico, aprontava em quase toda a cidade, que na época se estendia até o canto da Fabril.

O nosso personagem tinha um comportamento pueril e algumas vezes manifestava um comportamento ameaçador ou amedrontador. Faísca era um exímio cleptomaníaco e não sabia distinguir o que tinha valor, daquilo que simplesmente não tinha valor nenhum. Não tinha o menor receio de mexer nas coisas do alheio e por conta desse comportamento, Faísca trazia em seu rosto marcas de agressões praticados por algumas das suas vítimas. Era inofensivo, mas, para época, um elemento de “alta periculosidade.”

Faísca gostava e abusava de uns “tragos”, principalmente de cachaça e do velho traçado, uma bizarra mistura de cachaça com Cinzano, e embriagado, mais amedrontador se tornava e mais preocupação causava para o seu Joaquim. Não foram poucas as visitas da “Maria Chiquita”, como se chamava o atual camburão, com a presença onipresente e elegante em seu terno de linho branco do delegado   Pedro Santos, Titular do 1º Distrito Policial, local conhecidíssimo por Faísca. O 1º DP ficava estrategicamente na Rua da Palma no coração da zona do baixo-meretrício e depois de alguns dias de reclusão, Faísca aprontava em alguns dos bordeis e se escondia no Beco Feliz no temido bairro do Desterro.

Era o larápio oficial da cidade, que de tantas confusões, cachaça e do velho traçado, envelheceu e adoeceu. Sem o acolhimento do seu avô, o bondoso e competente ourives, que já havia entregado a moeda para o barqueiro, Faísca estava sozinho, desamparado e sem ninguém para resolver os seus desatinos. E como Deus existe, surgiu na vida do nosso herói marginal, um anjo chamado de Dr. Celso Coutinho, que acolheu e recuperou o “irrecuperável” Faísca, com muito trabalho e confiança, até o último dia de sua vida.

Faísca morreu honesto e faz parte como um dos meus personagens da história de São Luís.

HAMILTON RAPOSO DE MIRANDA FILHO.

 

 

BOTA PRA MOER, A GENIALIDADE DA LOUCURA.

 

Falar em Bora Pra Moer nos dia de hoje, com certeza vai nos remeter ao bloco carnavalesco idealizado pelo grupo Creolina de Alê Muniz e Luciana Simões. Falar sobre Bota Pra Moer é conversar sobre uma das figuras mais emblemáticas da história de São Luís.

Bota Pra Moer era uma mistura de “gênio e de louco”, gênio para uns, louco para outros. O fato é que este personagem existiu em São Luís entre as décadas de 1940 a 1960.

O poeta, escritor e musicista Lopes Bogéa, escreveu em um dos seus livros as peripécias fantásticas deste homem, que tinha o nome de Antônio Lima, era pernambucano e teria chegado em São Luís na década de 1940. Não há registro histórico que teria chegado aqui pelas mãos de Vitorino Freire, um dos maiores políticos brasileiros do século passado e nem pelas mãos de Francisco de Paula Gomes, o maior paisagista de São Luís.

Bota Pra Moer era um andarilho e teria chegado em São Luís pelas próprias pernas, e este hábito de andar, às vezes sem nenhum sentido, era visto todos os dias, quando fazia o percurso da Praça João Lisboa pela Rua Grande até a confluência desta rua com a Rua do Passeio, em um ir e vir, que se repetia várias vezes ao dia.

Existe várias histórias e estórias sobre a vida de Bota Pra Moer, uma delas é que ele teria perdido parte da sua sanidade mental ao tentar decorar a tábua logaritmos, alguns que o conheciam, afirmam que ele decorou a tábua de logaritmos até o número 9, outros afirmam que ele decorou o dicionário da língua portuguesa e depois teria esquecido tudo que havia decorado. Outros fatos interessantes, era sua extrema capacidade de realizar qualquer tipo de cálculo matemático utilizando-se apenas da sua fantástica capacidade neuronal e da sua prodigiosa memória; alguns afirmavam que Bota Pra Moer conseguia ler o Jornal do Povo e o Jornal Pequeno de cabeça para baixo com uma rapidez que deixava a população de São Luís impressionada com a dualidade de “gênio e louco”.

Porém, o fato mais importante e marcante na vida de Bota Pra Moer, aconteceu em 1950, durante o episódio da greve geral, elevando São Luís ao título de Ilha Rebelde em 1951. Segundo o escritor e historiador Benedito Buzar, tudo aconteceu quando o povo de São Luís contestou o resultado das eleições e resistiu a posse de Eugênio de Barros, alegando fraude eleitoral no pleito de 1950, pleito este disputado entre Saturnino Bello e Eugênio de Barros.

A população não aceitava o resultados das eleições e transformou São Luís em uma verdadeira praça de guerra durante seis meses.

Segundo o jornalista Ribamar Correia, o QG dos revolucionários, também chamados de oposições coligadas, ficava situado na Praça João Lisboa, exatamente o local preferido do nosso personagem. E em um levante revolucionário, as oposições coligadas resolveram tomar de assalto o Palácio dos Leões, sede do executivo maranhense, e retirar vivo ou morto o então governador Eugênio de Barros, que tinha dado ordens à Polícia Militar de abrir fogo a quem chegasse até a Praça Benedito Leite, o chamado “Paralelo 38”.

Os oposicionistas liderados por Neiva Moreira, Lino Machado, Djalma Marques, Clodomir Milel e muitos outros, resolveram a base da força e da coragem ultrapassar o “Paralelo38”, tendo à frente dos revolucionários o gênio louco Bota Pra Moer, que garbosamente empulhava a bandeira brasileira e ao adentrarem na Praça Benedito Leite, vindos pela Rua de Nazaré, a Polícia Militar não perdoou e obediente ao governador, meteu bala na população revoltada e ao ouvir o primeiro tiro, Bota Pra Moer em toda a sua genialidade, se voltou para os líderes oposicionistas e disse autoritariamente, “arruma uma mais doido do que eu, que daqui eu não passo”.

Bota Pra Moer segundo Lopes Bogéa, teria morrido afogado em uma lagoa poluída por dejetos no bairro do Retiro Natal.

O gênio e o louco, este foi Bota Pra Moer, mais um personagem da história de São Luís.

HAMILTON RAPOSO DE MIRANDA FILHO