domingo, 28 de outubro de 2018


O DOMINGO COM MARROM GLACÊ

Tenho me preocupado nos últimos anos com o futuro do marrom glacê. Um doce pouco lembrado, mas que tem a cara e a marca registrada da sobremesa típica da casa dos meus pais.
O doce não era uma sobremesa comum, tinha lá seus encantos e particularidades. A marca preferida dos meus pais era Cica e era sempre servido após o almoço de domingo, na companhia do insubstituível e irresistível queijo de cuia.
O almoço especial do domingo tinha sempre galinha ao molho pardo e algumas vezes linguiça de Buriti Bravo trazida pelo seu Teodoro, um amigo de infância do meu pai, e como “petit resistece” alguma invenção culinária da minha irmã Hamilena, tirada dos seus inúmeros cadernos de receitas. O comando da cozinha era de Crizálida, uma negra quilombola, companheira dos meus pais enquanto tiveram vida, e de Crizálida, além do afeto e da companhia, trago a coroa de São Benedito como presente de casamento.
Durante o almoço discutíamos política, comíamos e bebíamos vinho tinto Raposa ou Cabeça de Touro. Às vezes, com finalidade de melhorar o sabor do vinho, adicionávamos guaraná Jesus, uma mistura bizarra que unia e divertia a minha família. Compartilhavam a mesa e a família: Teresa e anteriormente Marli e Estela.
Após o almoço o marrom glacê em companhia do queijo de cuia era servido triunfalmente e depois, em um ritual contemporâneo, brindávamos a alegria e a presença de todos sob a benção do aperitivo San Rafael e finalizávamos a tarde com alguns comprimidos de Metionina ou Xantinon B12.
A lembrança do marrom glacê surgiu em uma dessas conversas de fim de ano. E em época de nuked cake, tortas, pavês e sofisticados suflês, a simplicidade do marrom glacê e dos doces caseiros perde o espaço merecido e ganha o esquecimento moderno da sofisticação.
Neste domingo de eleição lembro um pouco dos doces de domingos da minha casa e da feliz convivência da família em volta de uma boa e simples mesa.
HAMILTON RAPOSO

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